Para evidenciar a importância de combater esse tipo de situação, com reflexos também na saúde e bem-estar humanos, o Conselho Regional de Medicina Veterinária do Estado de São Paulo (CRMV-SP), por meio de sua Comissão Técnica de Bem-estar Animal, lança a segunda edição do “Guia Prático para Avaliação Inicial de Denúncia de Maus-tratos a Cães e Gatos”.
A publicação foi elaborada para atualizar as orientações a médicos-veterinários, zootecnistas, biólogos, protetores e representantes do terceiro setor, assim como agentes de segurança pública e funcionários do poder jurídico, entre outros, quando da suspeita de maus-tratos contra cães e gatos.
O Guia traz informações e referências também sobre bem-estar animal, uma vez que a caracterização de maus-tratos ocorre devido ao afastamento das condições de bem-estar que o animal deveria vivenciar. Como o nome mesmo informa, a publicação pretende ser um guia para uma avaliação inicial, não tendo a pretensão de esgotar ou capacitar plenamente sobre um tema tão complexo e multidisciplinar.
A presidente da Comissão de Bem-estar Animal do CRMV-SP, Cristiane Schilbach Pizzutto, destaca que o guia é como uma atualização da primeira versão elaborada em 2018. “A ciência do bem-estar animal vem evoluindo de forma tão vertiginosa, que, quando iniciamos o processo de atualização do material, vimos que era necessário praticamente confeccionar um novo guia. Ao longo destes seis anos, não apenas houve uma enxurrada de pesquisas científicas publicadas, como também nossas vivências e experiências pessoais com o tema trouxeram a possibilidade de elaborar um material reflexivo e que mostra a complexidade de lidar com o tema”, declara.
Para a integrante da Comissão de Bem-estar Animal do CRMV-SP, Paula Andrea de Santis Bastos, foi muito gratificante participar da elaboração da publicação. “O tema é atual, importante e de amplo interesse. O grande desafio foi identificar o limite das informações selecionadas, de forma que até uma pessoa leiga pudesse entender claramente, sem que ficassem dúvidas.”
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Complexidade da avaliação
A presidente da Comissão de Bem-estar Animal do CRMV-SP destaca que, para a avaliação de maus-tratos, é preciso considerar as particularidades de cada animal como indivíduo único e a complexidade que envolve o entendimento das necessidades biológicas e etológicas de determinada espécie. “Não podemos simplesmente validar uma situação pela ótica humana, isto é irresponsabilidade e falta de ética”, declara Cristiane.
Paula Andrea destaca que bem-estar e maus-tratos aos animais são temas complexos e técnicos. “Para trabalhar nessa identificação, são necessárias capacitação extensa e profunda, e ter maturidade e equilíbrio, características que podem estar presentes também em uma pessoa jovem e são essenciais”, afirma.
Férias e abandono
Os índices de abandono de animais aumentam muito nos meses de férias escolares, no período de dezembro até o Carnaval e também em julho. A integrante da Comissão de Bem-estar Animal do CRMV-SP destaca que maus-tratos de cães e gatos – e abandono é uma forma de maus-tratos – é crime no Brasil. “A Lei de Crimes Ambientais, Lei n° 9.605/1998, em seu artigo 32, prevê pena de detenção de três meses a um ano, mais multa, àquele que maltratar, abusar, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos. Em 2020, com a aprovação da Lei nº 14.064/2020, conhecida como ‘Lei Sansão’, cometer maus-tratos contra cães e gatos determina aumento da pena de reclusão para dois a cinco anos, mais o pagamento de multa e a perda da guarda. Há aumento da pena de um sexto a um terço na ocorrência da morte do animal”, destaca Paula Andrea.
A integrante da Comissão entende que, infelizmente, cães ainda são vistos como objetos descartáveis, ou de status social, sendo abandonados quando não há mais interesse. “Essa situação está intimamente relacionada ao modismo de raça, fábrica de filhotes, adoção por impulso, além de guarda irresponsável do animal”, cita.
“Além de ser crime, o abandono traz aos animais consequências desastrosas às suas saúdes física e mental. É imprescindível termos campanhas permanentes sobre guarda responsável. Os animais não são objetos, tampouco passíveis de descarte, eles são seres sencientes, que sofrem, sentem dor, angústia e merecem ser tratados com respeito e dignidade”, enfatiza a presidente da Comissão do CRMV-SP.
Teoria do elo
A presidente e a integrante da Comissão também reiteram a necessidade de os profissionais da área da saúde animal fornecerem informações e orientações às pessoas, sobre o compromisso com os cuidados e atendimento de todas as necessidades dos animais.
“Nós devemos amá-los e procurar informações técnicas para cuidar deles. Muitas situações caracterizadas como maus-tratos aos animais ocorrem devido à negligência, ou seja, omissão involuntária do cuidado, deixando de atender às necessidades, por desconhecimento ou falta de orientação técnica de como deve ser feito”, declara Paula Andrea.
A complexidade do tema, entretanto, vai além de uma avaliação apenas dos animais, lembra a presidente da Comissão de Bem-estar Animal do CRMV-SP. “Os animais de estimação podem ser indicadores de problemáticas muito mais profundas de um lar ou um núcleo familiar, como violência a crianças, mulheres ou idosos. É o que chamamos de Teoria do Elo, a interconexão entre a ocorrência de maus-tratos aos animais e às diferentes formas de violência interpessoal”, explica Cristiane, ressaltando a necessidade de atenção especial das autoridades.